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Almeida Prado

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Desinformação, poder de polícia do TSE e o Efeito Streisand – Quando a tentativa de remover uma informação acaba chamando mais atenção para ela
24/10/22

Gabriela Vilela Buzzo
Advogada

Amplamente repercutida pela mídia nos últimos dias, a decisão liminar que suspendeu, até o segundo turno, a exibição do documentário intitulado “Quem mandou matar Jair Bolsonaro?”, sobre o ataque sofrido em 2018 pelo atual Presidente da República, do canal do Youtube Brasil Paralelo, levantou discussões acerca da atuação do Superior Tribunal Eleitoral.

O que por muitos foi entendido como uma espécie de “censura prévia”, teve como justificativa, segundo a própria decisão de autoria do Ministro Benedito Gonçalves, a adoção de uma “mínima intervenção necessária para preservar a legitimidade das eleições e o equilíbrio da disputa”.

E a mínima intervenção, neste caso, se deu pelo entendimento de que o documentário, travestido de informação jornalística, nada mais era do que uma peça de propaganda da campanha presidencial.

Em trecho da decisão, o ministro relator afirmou que “a semana de adiamento não caracteriza censura. Apenas evita que tema reiteradamente explorado pelo candidato em sua campanha receba exponencial alcance, sob a roupagem de documentário que foi objeto de estratégia publicitária custeada com substanciais recursos de pessoa jurídica.”

A decisão ainda alertou para o perigo do uso indevido dos meios de comunicação combinado com a produção de documentários e a utilização de formato jornalístico para divulgar conteúdos desinformativos (sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados).

Não descartou a sensibilidade do tema, eis que se propõe a avaliar “os limites da liberdade de expressão frente à indispensável manutenção de um ambiente democrático sadio, em que seja possível a eleitoras e eleitores, de qualquer corrente política, decidir seu voto a partir de informações verdadeiras”.

De fato, a interpretação dada pelo ministro foi a de que o documentário, na verdade, consistia em “propaganda eleitoral em sítios de pessoas jurídicas na internet” o que é vedado pelo art. 57-C, § 1º, I da Lei 9.504/97. O conteúdo, então, teria apenas a roupagem de um conteúdo jornalístico.

Sendo assim, a irregularidade do meio de veiculação seria “suficiente para autorizar a derrubada do conteúdo, inclusive no exercício do poder de polícia, se inequívoco o caráter eleitoral da veiculação (art. 7º, da Res.-TSE 23.610/2019).”

Cabe apenas refletir se a remoção de conteúdo acaba efetivamente publicizando e chamando mais atenção a um conteúdo que se buscou ocultar.

Em entrevista dada à Folha de São Paulo, o autor do livro “Free Speech”, deu um exemplo de moderação que acabou tomando proporções não desejáveis, chamando atenção para a informação.

(https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/10/entrada-do-judiciario-no-debate-politico-pode-ser-tiro-pela-culatra-diz-ativista-da-liberdade-de-expressao.shtml)

O exemplo que ele citou foi a uma reportagem do New York Post sobre o filho de Joe Biden, Hunter, que foi removida pelo Facebook. A remoção, naquele caso, acabou gerando maior impacto ao redor do conteúdo.

Entre nós, neste caso recente, a suspensão da exibição do documentário até a realização do segundo turno das eleições acabou atraindo grande atenção para o assunto, movimentando as redes sociais sob alegação de censura.

Ainda que os limites à liberdade de expressão ainda sejam matéria controversa e mal resolvida no direito eleitoral, fato é que decisão é coerente com a jurisprudência histórica da Justiça Eleitoral, tem fundamento legal e está longe de ser um ponto fora da curva.

(Contém trechos da decisão liminar proferida pelo ministro do TSE Benedito Gonçalves na Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 0601522-38.2022.6.00.0000, em 20/10/2022)

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